22 December 2012

soneto de aniversário

passem-se dias, horas, meses, anos
amadureçam as ilusões da vida
prossiga ela sempre dividida
entre compensações e desenganos.

faça-se a carne mais envilecida
diminuam os bens, cresçam os danos
vença o ideal de andar caminhos planos
melhor que levar tudo de vencida.

queira-se antes ventura que aventura
à medida que a têmpora embranquece
e fica tenra a fibra que era dura

e eu te direi: amiga minha, esquece...
que grande é este amor meu de criatura
que vê envelhecer e não envelhece

13 December 2012

nem da erva humilde se o destino esquece
seiva a lei o que vive

de sua natureza murcham rosas
e prazeres se acabam

quem nos conhece, amigo, tais quais fomos?
nem nós os conhecemos.

9 December 2012

les nouvelles nourritures

in the way to saint michel's castle
Je reconnais que je me suis longtemps servi du mot Dieu comme d’une sorte de dépotoir où verser mes concepts les plus imprécis. Cela finit par former quelque chose de fort peu semblable au bon Dieu à barbe blanche de Francis Jammes, mais de guère plus d’existant. Et comme il advient que les vieillards perdent successivement cheveux et dents, vue, mémoire et enfin la vie, mon Dieu perdit en vieillissant (ce n’est pas lui qui vieillissait, c’est moi) tous les attributs dont je l’avais revêtu naguère ; à commencer (ou à finir) par l’existence, ou, si l’on veut, par la réalité. Cessé-je de penser, il cessait d’être. Seule mon adoration le créait. Elle pouvait s’en passer de lui ; Lui ne pouvait pas se passer d’elle.

Eu reconheço que por muito tempo utilisei a palavra Deus como uma espécie de repositório onde despejar meus conceitos mais imprecisos. No fim isso formou alguma coisa muito pouco parecida ao bom Deus com barba branca de Francis Jammes, mas nem por isso mais real. E como acontece que os velhos percam sucessivamente os cabelos e os dentes, a vista, a memória e por fim a vida, ao envelhecer meu Deus perdia (não era ele que envelhecia, era eu) todos os atributos que dos quais eu lhe havia revestido ; a começar (ou por fim) pela existência, ou, se acharmos melhor assim, pela realidade. Quando eu cessei de pensar, ele cessava de existir. Apenas minha adoração o criava. Ela podia existir sem ele ; Ele não podia existir sem ela.

2 December 2012

les nouvelles nourritures

in the way to saint michel's castle
Il est bien plus difficile qu’on ne croit de ne pas croire à Dieu. Il faudrait n’avoir jamais vraiment regardé la nature. La moindre agitation de la matière… Pourquoi se soulèverait-elle ? Et vers quoi ? Mais cette information ne m’écarte pas moins de votre credo que de l’athéisme. Que la matière soit pénétrable et ductile et dispose à l’esprit ; que l’esprit ait partie liée avec la matière jusqu’à se confondre avec elle -, je veux bien appeler religieux mon étonnement devant cela. Sur cette terre tout m’étonne. Appelons adoration ma stupeur, j’y consens. La belle avance ! Non seulement je ne puis pas voir votre Dieu dans tout cela ; mais au contraire, je vois, je découvre partout qu’il ne saurait y être, qu’il n’y est pas.

É bem mais dificil do que se imagina não acreditar em Deus. Seria necessário nunca ter realmente observado a natureza. Uma minima agitação da matéria… porque ela se move? Com qual fim ? Mas essa informação não me desvia mais do teu credo que do ateísmo. Que a matéria seja penetrável e dútil e disposta au espírito ; que o espírito seja associado à matéria ao ponto de se confundir com ela – eu aceito de bom grado dar o nome de religioso ao meu espanto diante dessa realidade. Nesse mundo tudo me surpreende. Chamemos de adoração o meu estupor, eu aceito. Que grande avanço ! Não apenas eu não consigo ver Deus em tudo isso ; pelo contrário, eu descubro por toda parte que ele não teria como estar em tudo, e que ele não ali não se encontra.